sábado, 10 de maio de 2014

DESTINO


Esses dias passei por uma situação que me fez pensar um pouco sobre o destino. Íamos visitar uma pessoa da família que estava muito mal na UTI de um hospital. Era quase certo que ela não sobreviveria aos próximos três dias. E falávamos sobre a situação, de como era injusta a doença para esta mãe, nova, boa pessoa... Até que surgiu a expressão de consolo: "é... é a vontade de Deus". Daí pensei: mas como assim "é a vontade de Deus"? Será que o destino de nossa irmã estava traçado? Será que nossa vida não passa de um filme cujo roteiro fazemos apenas interpretar? Será que não importa o que façamos o resultado será sempre o mesmo? Será que a situação dela não poderia ser outra? Será que não ocorrera um erro médico? Será que o tratamento fora o mais adequado? Será que ela teve acesso aos medicamentos mais indicados? Será que foi tudo feito no tempo devido? Destes questionamentos decorreu logicamente pensar em livre arbítrio. Temos realmente livre arbítrio? Ele é absoluto ou relativo?
Basicamente sobre este assunto existem três posições possíveis: 1) o Determinismo, 2) o Livre Arbítrio absoluto e 3) um misto dos dois, o Livre Arbítrio relativo. Então resolvi fazer uma pequena pesquisa sobre o tema, para ver como a humanidade tratou deste assunto na história. Para os Vedantas, haveria um plano traçado, mas que seria aberto à mudança pelo agir. Para os Estóicos, o futuro seria tão inalterável quanto o passado - portanto zero de livre arbítrio. No Epicurismo, tudo que existe seria o caos, tudo é obra do acaso, muito semelhante ao pensar do Existencialismo de Sartre, segundo o qual "acreditar em um futuro com cartas marcadas equivaleria a escapar da responsabilidade de tomar decisões", o que redundaria, em última análise, em um mundo sem sentido, vazio, triste. Para o Cristianismo, a crucificação de Jesus fazia parte dos planos divinos, que se cumpriram com a traição de Judas, que, neste caso, estaria predestinado a ser mau. Para Calvino, Deus escolheu de antemão os que se salvam e os que não se salvam. Para o Vaticano e a teologia Muçulmana, o livre arbítrio seria uma peça necessária à responsabilidade moral.
Para as doutrinas e religiões reencarcionistas, mormente o Espiritismo, bem resumidamente falando, o livre arbítrio seria o fundamento da condição humana, posto que nossa evolução espiritual decorreria diretamente das escolhas que fazemos em cada encarnação. Viríamos para esta vida com um plano traçado, normalmente com a nossa participação, para que possamos passar por aquelas situações que nos dariam a oportunidade de acertar velhas diferenças, velhas dificuldades, velhas dívidas. E para tanto esse plano nos colocaria no local mais adequado, na condição social mais adequada, na família mais adequada, no país mais adequado, no corpo mais adequado. Tudo pensado para que possamos eliminar nossos débitos pretéritos e agir positivamente em prol de nossa evolução espiritual em cada encarnação. Mas será que dá tudo certinho? Será que nós agimos como foi planejado? Será que os outros agem de acordo para que o planejado para nós e para eles? Enfim, este plano reencarnatório interfere de alguma forma no nosso livre arbítrio?
No meu modo de ver, e de acordo com o que podemos inferir da própria literatura, pode ocorrer de tudo: pode ser que o plano seja alcançado total ou parcialmente; pode ser que o espírito recaia nas mesmas circunstâncias negativas e tenha que voltar para outra tentativa. Ou seja, na prática o que existe é uma probabilidade de que o plano venha a se cumprir, mas não certeza. Este plano também poderia ser chamado de Darma, que decorre do Carma, que é palavra de origem sânscrita que pode ser conceituada como o conjunto das ações individuais e coletivas, que pela ação da Lei de Ação e Reação, vai gerar as suas consequências. É uma decorrência natural do exercício do livre-arbítrio. O carma é composto por muitas linhas divergentes e conflitantes decorrentes das diversas ações harmônicas e desarmônicas que cometemos no passado. A linha de tendência resultante de todas essas múltiplas ações aponta numa determinada direção e assume um determinado propósito, alinhado com a ordem divina do universo e de nossa vida em particular. Essa direção – ou plano - é o Darma. Para atingirmos o nosso darma, temos de navegar nas “ondas” revoltas do carma, até que essas ondas estejam todas alinhadas e não exista mais diferença entre o carma e o darma.
Mas nem tudo é colheita no carma. Longe disso. Há inúmeros erros novos sendo plantados o tempo todo. Há centenas de milhares de novas injustiças sendo cometidas pela primeira vez. Mas também há inúmeros acertos e boas ações sendo praticadas pela primeira vez. Todos estes desequilíbrios e equilíbrios terão que ser reparados e compensados a seu devido tempo. Um dos princípios fundamentais da filosofia esotérica ensina que, através da lei da reencarnação, todo o esquema da natureza funciona e evolui de modo perfeitamente justo.  Este axioma da sabedoria eterna necessita ser examinado com bom senso. De fato, todo o esquema da natureza é justo. Disso não há a menor dúvida.  Mas ele é justo no sentido de que está sempre corrigindo a si mesmo, e não no sentido de que faz perfeita justiça em cada um dos seus momentos, vistos isoladamente.

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