quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

UMA ORAÇÃO PARA OS NOVOS TEMPOS

Que honremos o fato de ter nascido, e que saibamos desde cedo que não basta rezar um Pai Nosso para quitar as falhas que cometemos diariamente. Essa é uma forma preguiçosa de ser bom. O sagrado está na nossa essência, e se manifesta em nossos atos de boa fé e generosidade, frutos de uma percepção profunda do universo, e não de ocasião. Se não estamos focados no bem, nossa aclamada religiosidade perde o sentido.

Que se perceba que quando estamos dançando, festejando, namorando, brindando, abraçando, sorrindo e fazendo graça, estamos homenageando a vida, e não a maculando. Que sejam muitos esses momentos de comemoração e alegria compartilhados, pois atraem a melhor das energias. Sentir-se alegre não deveria causar desconfiança, o espírito leve só enriquece o ser humano, pois é condição primordial para fazer feliz a quem nos rodeia.

Que estejamos abertos, se não escancaradamente, ao menos de forma a possibilitar uma entrada de luz pelas frestas – que nunca estejamos lacrados para receber o que a vida traz. Novidade não é sinônimo de invasão, deturpação ou violência. Acreditemos que o novo é elemento de reflexão: merece ser avaliado sem preconceito ou censura prévia.

Que tenhamos com a morte uma relação amistosa, já que ela não é apenas portadora de más notícias. Ela também ensina que não vale a pena se desgastar com pequenas coisas, pois no período de mais alguns anos estaremos todos com o destino sacramentado, invariavelmente. Perder tempo com picuinhas é só isso, perder tempo.

Que valorizemos nossos amigos mais íntimos, as verdadeiras relações pra sempre.

Que sejamos bem-humorados, porque o humor revela consciência da nossa insignificância – os que não sabem brincar, se consideram superiores, porém não conquistam o respeito alheio que tanto almejam. Ria de si mesmo, e engrandeça-se.

Que o mar esteja sempre azul, que o céu seja farto de estrelas, que o vinho nunca seja proibido, que o amor seja respeitado em todas as suas formas, que nossos sentimentos não sejam em vão, que saibamos apreciar o belo, que percebamos o ridículo das ideias estanques e inflexíveis, que leiamos muitos livros, que escutemos muita música, que amemos de corpo e alma, que sejamos mais práticos do que teóricos, mais fáceis do que difíceis, mais saudáveis do que neurastênicos, e que não tenhamos tanto medo da palavra felicidade, que designa apenas o conforto de estar onde se está, de ser o que se é e de não ter medo, já que o medo infecciona a mente.

Que nosso Deus, seja qual for, não nos condene, não nos exija penitências, seja um amigo para todas as horas, sem subtrair nossa inteligência, prazer e entrega às emoções que nos fazem sentir plenos.

A vida é um presente, e desfrutá-la com leveza, inteligência e tolerância é a melhor forma de agradecer – aliás, a única.

Martha Medeiros

http://www.clicrbs.com.br/jsc/sc/impressa/4,1147,4212539,22441

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

O SIMBOLISMO MAÇÔNICO (UMA RESENHA)*

Como todo grupo humano, a Maçonaria utiliza sinais, linguagem e gestos com significações específicas. Esses sinais, essa linguagem e esses gestos necessitam ser reconhecidos por todos, num mesmo contexto, a fim de se tornarem compreensíveis.
Os símbolos maçônicos têm sido usados em todas as épocas e em todos os países com a intenção de produzir interpretações morais. Por isso se diz que a Maçonaria é uma instituição de formação moral que utiliza uma linguagem simbólica.
Em outras palavras: a finalidade da linguagem simbólica é poder ser compreendida por cada um com uma “imprecisão organizada”, isto é, permitindo um espaço onde haja liberdade de interpretação, embora sempre dentro da intenção moralizante.
O sistema educativo da Maçonaria é dúbio: ele se utiliza tanto da racionalidade – inteligência, saber, informação – quanto da “irracionalidade” – intuição e afetividade.
Mas qual a função do simbolismo na Maçonaria? O simbolismo maçônico responde a várias funções essenciais que fazem dele a infraestrutura indispensável à sobrevivência da Maçonaria.
Vejamos algumas dessas funções:
A função de distinção: externamente, o simbolismo serve para distinguir o iniciado do profano, provocando a separação dos dois mundos; internamente, serve para distinguir funções, graus e níveis hierárquicos.
A função moralizadora: os símbolos pretendem orientar o nosso comportamento. Esta função evolui no tempo: a moral maçônica se torna natural, laica, religiosa, racionalista, etc., conforme a época e os locais onde se situa.
A função social: o simbolismo desempenha um papel de organização na vida da Loja e da Ordem ao distinguir e coordenar as funções, os graus e os níveis hierárquicos.
A função unificadora: a prática de um simbolismo comum promove o sentimento de integração de todos os membros da Ordem espalhados no mundo.
A função reconciliadora: o símbolo reconcilia religião e ciência, espiritualismo e materialismo, pensamento lógico e intuição. A Iniciação maçônica é um exemplo claro dessa reconciliação.
A função metafísica: os símbolos permitem um contato com o absoluto, à medida que representam algo que não se restringe aos limites de tempo e espaço.
A função gnóstica: o símbolo pretende, através da intuição e da analogia, produzir um tipo de interpretação da realidade.
A função libertadora: o símbolo, na medida em que permite reunir coisas díspares – racionais e intuitivas, religiosas e científicas - concede um grau de liberdade ao iniciado que conduz ao desenvolvimento pessoal não dogmatizado.
A função orientadora: o simbolismo maçônico expressa um universo moral que estabelece uma escala de valores que orienta e justifica o comportamento do iniciado.
A função emotiva: falando ao coração, tanto quanto à razão, o símbolo consegue integrar emoções no processo de ultrapassar os impulsos egocêntricos.
Falar de Maçonaria, portanto, é falar de simbolismo. É este que a funda e a funde; que lhe
deu nascimento e a mantém viva.
Sem o simbolismo, a Maçonaria deixa de existir.
*Resenha do artigo de Luc Nefontaine da Universidade de Bruxelas, Bélgica em artigo traduzido pelo Ir.'.Mariano Moreira e publicado em O PRUMO, nº 134, pp. 22-23.
In "Pedra Por Pedra" - Francisco Cezar de Luca Pucci

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

O BEM E O MAL

Um dos anciãos da cidade disse:
"Fala-nos do Bem e do Mal."
E ele respondeu:
"Do bem que está em vós, poderei falar, mas não do mal.
Pois que é o mal senão o próprio bem torturado por sua fome e sede?
Em verdade, quando o bem sente fome, procura alimentos até nos antros escuros, e quando sente sede, desaltera-se até em águas estagnadas.
Vós sois bons quando vos identificais com vós próprios.
Porém, quando não vos identificais com vós próprios, não sois maus.
Pois a casa que se divide não se torna antro de ladrões; é, apenas, uma casa dividida.
E um navio sem leme pode vaguear sem rumo entre recifes perigosos, e não se afundar.
Vós sois bons quando vos esforçais por dar de vós próprios.
Porém, não sois maus quando vos limitais a procurar o lucro.
Pois, quando lutais pelo lucro, sois simplesmente raízes que se agarram à terra e sugam seu seio.
Certamente a fruta não pode dizer à raiz: "Sê como eu, madura e plena, e sempre generosa de tua abundância."
Pois, para a fruta, dar é uma necessidade como, para a raiz, receber é uma necessidade.
Vós sois bons quando falais plenamente acordados.
Porém, não sois maus quando adormeceis enquanto vossa língua tartamudeia sem propósito.
E mesmo um discurso gaguejante pode fortalecer uma língua débil.
Vós sois bons quando andais rumo a vosso objetivo, firmemente e com passos intrépidos.
Porém, não sois maus quando ides coxeando.
Mesmo aqueles que coxeiam não andam para trás.
Mas vós que sois fortes e velozes, guardai-vos de coxear por complacência na presença dos coxos.
Vós sois bons de inumeráveis maneiras, e não sois maus quando não sois bons.
Estais apenas ociosos e indolentes.
Pena que as gazelas não possam ensinar a velocidade às tartarugas.
Na vossa ânsia pelo vosso Eu-gigante está vossa bondade: e essa ânsia está em todos vós.
Mas em alguns, essa ânsia é uma torrente que se precipita impetuosamente para o mar, carregando os segredos das colinas e as canções da floresta.
Em outros, é uma corrente preguiçosa que se perde em meandros, e serpenteia, arrastando-se, antes de atingir a costa.
Mas que aquele que muito deseja se guarde de dizer àquele que pouco deseja: "Por que és lento e atrasado?"
Pois o verdadeiramente bom não pergunta ao desnudo: "Onde está tua roupa?" nem ao desabrigado:
"Que aconteceu à tua casa?"

In Gibran Khalil Gibran - O Profeta

sábado, 8 de fevereiro de 2014

O AUTO-CONHECIMENTO

Um homem disse: "Fala-nos do Conhecimento de Si Próprio."
E ele respondeu, dizendo:
"Vossos corações conhecem em silêncio os segredos dos dias e das noites.
Mas vossos ouvidos anseiam ouvir o que vossos corações sabem.
Desejais conhecer em palavras aquilo que sempre conhecestes em pensamento.
Quereis tocar com os dedos o corpo nu de vossos sonhos.
E é bom que vós o desejeis.
A fonte secreta de vossa alma precisa brotar e correr, murmurando, para o mar;
E o tesouro de vossas profundezas ilimitadas precisa revelar-se a vossos olhos.
Mas não useis balanças para pesar vossos tesouros desconhecidos;
E não procureis explorar as profundidades de vosso conhecimento com uma vara ou uma sonda.
Porque o Eu é um mar sem limites e sem medidas.
Não digais: "Encontrei a verdade." Dizei de preferência: "Encontrei uma verdade."
Não digais: "Encontrei a senda da alma." Dizei de preferência: "Encontrei a alma andando em meu caminho."
Porque a alma anda por todos os caminhos.
A alma não caminha numa linha reta nem cresce como um caniço.
A alma desabrocha, tal um lótus de inúmeras pétalas."

In "O Profeta" - GIBRAN KHALIL GIBRAN