Os teóricos falam por si mesmos. Nenhuma
ocorrência em suas vidas revela uma experiência que possa comprovar a
pregação vociferante com que alardeiam sua inscrição nas supostas castas
superiores da existência.
Imaginem um ser da magnitude de Buda
recitando as sublimes sutras com o coração repleto de ilusões e desejos.
Imaginem São Francisco de Assis vestindo sofisticados paramentos e
pompas, bebendo e comendo como um desenfreado. A distância que existe
entre a prática e a teoria é a mesma que separa o homem do animal. Com
uma diferença em favor dos animais: eles não dissimulam, não premeditam,
não alteram as leis nem dão tampinhas no ombro. Por isso eram chamados
de irmãos por São Francisco: irmão lobo, irmão pombo, irmão gato, irmão
peixe. Para o santo, tudo respira fraternidade: irmão Sol, irmã Lua…
Quando São Francisco dizia “Senhor, fazei
de mim um instrumento de vossa Paz” é porque ele punha em prática a
Paz. Ninguém presenciou o Poverello de Assis incitando as pessoas à
revolta. Nem fuxico, nem fofocas. Quando ele dizia “onde houver ódio,
que eu leve o amor” é porque sua vida consistia em perdoar, fazia isso o
tempo todo. Quando ofendido, ele levava o perdão, onde houvesse
discórdia, levava a união. (Imagino que São Francisco não tivesse dedo,
pois nunca se ouviu dizer que ele apontara o dedo para outra pessoa.)
Mesmo imaginando um absurdo: que Francisco de Assis não fosse um Cristão
– ele agiria exatamente dessa forma porque ESTA ERA A SUA NATUREZA
ÍNTIMA, sua verdade e sua experiência de vida. Onde havia dúvida, ele
levava a fé, onde percebesse o erro, a verdade – sem qualquer
estardalhaço ou discurso tonitruante. Era prático e não teórico, era um
discípulo dos ensinamentos de Jesus e também como um Buda: conhecia as
raízes do sofrimento, sua natureza, sua origem, e o meio que conduz à
beatitude. Desejoso de bem empregar sua vida, Francisco foi um homem
feliz apesar de sempre pensar na morte e estar preparado para ela. Onde
presenciou o desespero, levou a esperança, onde percebia a tristeza,
levou alegria. Foi pela experiência pessoal, pela REFLEXÃO e pelo
exemplo de vida que as palavras de Francisco de Assis escaparam da letra
morta (teoria) e pulsam, ainda hoje, no âmago de cada homem e mulher.
Levou a Luz onde havia trevas; ensinou a VIRTUDE pelo exemplo,
combatendo os VÍCIOS através de uma vida comedida e pura.
Buda, Jesus e São Francisco optaram pela
modéstia ao invés da humildade. A modéstia é melhor porque vem do
coração. A humildade muitas vezes procede da razão como vestimenta ou
capa de proteção. Já ouvi dizer que a maior das vaidades está sob essa
capa de humildade e pode irromper, como uma fera, a qualquer instante e à
menor provocação. Por outro lado, a modéstia é decência, compostura,
moderação e sobriedade, especialmente no falar.
Quando a capa da humildade reveste os
pusilânimes, eles “dão seu show particular e jogam para a platéia”.
Pensam que não são observados e se esquecem de que apenas a curiosidade
os conduziu aos portais sagrados da Iniciação e ao lugar que ocupam;
que, no íntimo, têm receio de serem descobertos. Inconscientemente,
ainda buscam mais auferir lucros materiais e distinções humanas do que
servir aos semelhantes. Alerta! quanto mais dissimulados são, mais estão
descobertos.
Os fatos estão bem aqui, debaixo dos nossos narizes.
Engana-se quem supõe permanecerem
invisíveis suas intenções. Nada escapa à visão criteriosa dos que nos
cercam. (Sou testemunha disso: não foram poucas as vezes que meus
verdadeiros amigos e irmão me alertaram nesse particular.) Aprendi que a
“massa” sorri e nos presta reverência em público. Curvar a coluna e
aplaudir é fácil, mera questão de treino e o hábito de agachar-se.
Presenciamos isso a todo instante. Mas, nos pequenos grupos e na solidão
de nossas meditações sabemos separar o joio do trigo. Esta é a grande
força invisível que, sem pressa, pela evolução e não pela revolução –
está mudando o mundo.
Você acha difícil? Eu também acho.
Acha impossível? Então…
Autor: José Maurício Guimarães
https://opontodentrocirculo.com/2015/04/09/iniciacao-na-pratica/