terça-feira, 25 de dezembro de 2012

O Anjo da Misericórdia



Na tarde trágica e tormentosa do Calvário, quando Jesus se encontrava estiolado pelas ulcerações dos cravos e dos espinhos implantados na Sua carne, ocorreu um inesperado acontecimento, que as testemunhas do lutuoso fato não puderam perceber, por transcorrer além das fronteiras objetivas da matéria.
As vozes ululantes da Natureza dominavam a paisagem lúgubre, e os homens, atormentados, pareciam vencidos pelas cruéis expressões do primitivismo animal, em total alucinação diante do Justo crucificado...
Nos momentos finais do horrendo espetáculo 3 vultos luminosos, reverentes, se acercaram do madeiro da agonia e um deles, jovem mulher iluminada, qual se fosse uma tocha de crepitante flama, após contemplar a face do Mestre, falou, comovida:
- Senhor, venho oferecer-Te o testemunho do meu fracasso na tarefa em que fui investida. 
"Segui-Te os passos por toda a parte e procurei guarida nos corações que foram atraídos pela Tua palavra consoladora. 
" Levantei ânimos, impulsionei sentimentos desavisados à razão e convoquei servidores ao trabalho da fraternidade... 
" Não obstante, estive contigo no momento da defecção de Simão Pedro, quando Te negou conhecer, o que fez por três vezes consecutivas, expulsando-me dos seus sentimentos, nos quais estive agasalhada por largos meses. 
" Desiludida dos homens, venho rogar-Te licença para seguir, ao Teu lado, na direcção dos Cimos Esplendorosos da Vida. 
" Tu sabes, eu sou a FÉ!... " 

O Mestre, em agonia, fitou-a, compungido, e sem dizer qualquer palavra, através da cortina de lágrimas sanguinolentas que lhe nublavam a claridade visual, olhou a segunda personagem, que também mais se acercou do instrumento da arbitrária punição e elucidou:
- Vivi todas as Tuas instruções e procurei remodelar os campos moral e emocional dos homens que Te seguiram. 

" Vi muitos deles, que estavam a borda do desespero e da loucura, mas, graças à Tua palavra de libertação, fi-los esperar por melhores dias confiando nos rectos deveres em favor de perspectivas futuras abençoadas. 
" Aqueles outros que se lamentavam sob o luto da saudade e o peso das agonias, consegui soerguer o ânimo e encorajá-los para a luta sem quartel do progresso. 
" Em todo o lugar, encontrei oportunidade de serviço e de acção edificante, que soube aproveitar... 
" Apesar disso, estava seguindo Judas e tentando convocá-lo à lucidez, arrependido como se apresentava, após a infame traição... Percebendo-lhe os pensamentos infelizes e o desespero envolvi-o em ternura chamando-o à ordem dizendo-lhe que sempre há oportunidade para quem deseja regenerar-se... 
" Ele, todavia preferiu o enforcamento covarde numa figueira brava... Ainda retenho na memória a visão do seu corpo oscilante na corda vigorosa em que ceifou a vida carnal... 
" Porque fracassei entre as criaturas venho rogar-Te permissão para acompanhar-Te ao solio do Altíssimo, abandonando a Terra... 
" Conforme Te recordas, eu sou a ESPERANÇA!..." 

Jesus estorcegou nas traves grosseiras, enquanto a mole humana, infrene e enlouquecida, agitava-se no acume do ensombrado morro da Caveira.
E porque Ele tentasse ouvir, já nas últimas contorções do corpo exangue, a terceira visitante uniu-se às duas primeiras e, ainda luminosa, expôs: 

- Por onde o Teu olhar passeou ternura e amor, eu procurei alojamento e serviço. 
" Através das Tuas mãos, abri bocas sem melodia à música da palavra; descerrei ouvidos moucos aos sons da Natureza; conduzi pernas e corpos mortos ao movimento; tomei as doenças dominadoras e consegui mudá-las das pessoas que as padeciam... 
" Jamais vacilei em ajudar, gerando simpatia, sustentando a FÉ e motivando a ESPERANÇA. 
" As multidões esfaimadas, por meu intermédio e sob as Tuas ordens, receberam pães e peixes, o mesmo ocorrendo com a água em Caná, quando eu lhe facultei especial sabor na festa das bodas felizes... 
" Mesmo assim em face do abandono a que todos Te relegaram, e porque acabo de presenciar o legionário Longinus, no cúmulo da frieza moral de que é portador e sem qualquer compaixão lancetar-Te o peito, para apressar-Te a morte, não suporto mais tanta ingratidão. 
" Recorro, deste modo, à Tua aquiescência para sair do mundo e voar na direcção das estrelas, para onde seguirás... 
" Bem recordas, eu sou a CARIDADE!... " 
Em face do silêncio pesado, que se fez natural, nauqela esfera transcendental, o Mestre, para surpresa geral, na noite que havia tombado sobre a tarde cruel, suplicou: 
- Perdoa-os (aos homens), meu Pai, porque eles não sabem o que fazem! 
Houve uma estranha movimentação no povo e nos milicianos, que não sabiam o que se passava. 

Naquele instante, porém, rasgou-se nas sombras espessas uma estrada luminosa e um ser, de esplêndida beleza, aproximou-se do Crucificado, e, respeitoso, falou, emocionado: 

- Eu sou o Anjo da MISERICÓRDIA, enviado pelo Pai, que Te atende o apelo. 

" Dize, Senhor, o que desejas de mim pois que eu o farei." 

Com a voz inaudível para os ouvidos humanos, no entanto, inteligível para o emissário de Deus, Jesus determinou, comovido: 

- Fica no mundo, levando contigo a FÉ, a ESPERANÇA e a CARIDADE, em meu nome, para que os homens, que me conheçam ou não, possam ter minoradas as suas dores e penas, evitando, quanto possível, as desventuras, sob o pálio do meu Amor. 

" Que permaneçam sem cansaço, nem desânimo até à consomação dos séculos, como luzes acesas apontando rumos felizes! " 

Automaticamente, as três Entidades - Virtudes abraçaram o Anjo da MISERICÓRDIA e partiram, para recolher, de início, o espírito Judas, em perturbação, prosseguindo na direcção de Pedro, a fim de que este não enlouquecesse de remorso, de imediato colocando nos olhos apagados de Longinus a claridade da visão... 

Foi então, que Jesus inteiriçou-se na cruz e bradou: 

- Pai, nas Tuas Mãos entrego o meu espírito. Tudo está consumado!
A partir daquela hora, quando as dores atingem o máximo de intensidade nos corações humanos; quando a hidra da guerra ceifa milhões de vidas indefesas; quando a amargura domina,esmagando os sentimentos; quando a vida parece sucumbir e todos os acontecimentos se apresentam com funestas perspectivas, o Anjo da MISERICÓRDIA envolve as criaturas, deixando aqui e ali, neste e naquele coração a chama da FÉ que reanima ou a pulsação da ESPERANÇA que renova e encoraja ou as mãos sublimes da CARIDADE, que sustenta e liberta, em nome do AMOR infinito do CRISTO, que não cessa jamais.
Fonte: LIVRO: "Pelos Caminhos de Jesus" 
Autor Espiritual: Amélia Rodrigues 
Psicografada por: Médium: Divaldo P. Franco
http://www.triangulodafraternidade.com/2012/12/o-anjo-da-misericordia.html#more



quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

SE CRISTO VOLTAR NESTE NATAL


O Que Ocorrerá Se Subitamente Surgir Em
Público Um Grande Instrutor da Humanidade? 

Carlos Cardoso Aveline

Os rótulos não substituem a realidade. A sabedoria divina flutua acima das aparências visíveis, dos nomes próprios e das imagens personalizadas. O conhecimento universal é como um círculo infinito cujo centro está em todas as partes: por isso, a essência de cada religião ou filosofia contém a essência de todas as outras.
Quando vemos em profundidade a figura de Jesus Cristo, reconhecemos que ele simboliza no Ocidente os sábios e os instrutores da humanidade.  Krishna, Buddha, Pitágoras, Platão, Lao-tzu, Confúcio e Cristo ensinam a mesma sabedoria universal.
Os grandes sábios jamais afastaram-se da humanidade, mas o contato com eles  não é verbal e visual. Os seres humanos recebem sua ajuda e sua inspiração em planos superiores de consciência, acima do que é percebido pelos cinco sentidos e pelo nível “pessoal”, denso e primário, da atividade do cérebro. O contato a ser buscado é com a sabedoria em si mesma e não com a personalidade deste ou daquele instrutor.  
Qual é, então, o verdadeiro significado da idéia de uma volta visível de Jesus? 
A idéia simboliza para a alma o retorno dos sábios ao convívio humano, em um plano consciente. É a volta da sabedoria, e a reconquista da paz e do equilíbrio nos assuntos humanos visíveis. Não há por que personalizar indevidamente o retorno. Trata-se de recuperar a paz individual e coletiva, e não de pedir autógrafo ou favores pessoais a algum artista famoso recém-chegado do céu.   
“Quando ocorrerá a volta?” perguntam-se as pessoas de boa vontade.
Vale a pena examinar a questão. Suponhamos que, de fato, um dos grandes instrutores da humanidade aceite a tarefa de retomar uma presença reconhecida e consciente junto à comunidade humana atual.  Adotemos, também, a hipótese de que, para a ocasião, ele decida aproveitar o clima de confraternização das festas de final de ano, retomando o contato de um modo que sua presença física possa ser facilmente reconhecida pelas pessoas de boa vontade como a presença do mesmo Jesus do Novo Testamento.   
Ele se tornará visível em Nova Iorque, entrando na sede das Nações Unidas? Ele conversará ali, a portas fechadas, com o secretário-geral?  Ou ele surgirá curando doentes entre os povos mais pobres e humildes da África? Talvez o instrutor sagrado mande um e-mail para os principais chefes de Estado? Quais as conseqüências políticas, sociais e econômicas do seu reaparecimento? Estas perguntas práticas são incômodas.  A aparição pública entre nós de um grande ser, um mestre sagrado, poderia colocar em cheque os hábitos pessoais e os apegos de muitos. Abalaria instituições e estruturas sociais. 
Para investigar o que ocorreria de fato se Jesus reaparecesse na próxima véspera de Natal, o primeiro passo consiste em resgatar um texto clássico. O escritor russo Fiódor Dostoievski descreveu em 1880 como teria sido o retorno físico de Cristo durante o século 16. 
Ao escrever o relato, intitulado “O Grande Inquisidor”, Dostoievsky pode ter sido inspirado desde níveis superiores de consciência. Um Raja-Iogue dos Himalaias não só pediu que o trecho fosse traduzido do russo e publicado em inglês por Helena Blavatsky  em 1881, mas também escreveu, em uma carta para um discípulo leigo:
“A sugestão de traduzir ‘O Grande Inquisidor’ é minha; porque seu autor, sobre quem já pesava a mão da Morte enquanto escrevia, deu a descrição mais convincente e mais verídica jamais escrita da Sociedade de Jesus. Está contida ali uma grande lição para muitos, e mesmo você poderá tirar proveito dela.” [1]
A narrativa faz parte da obra “Os Irmãos Karamázovi”, e nela Dostoievsky descreve a aparição do instrutor divino entre os habitantes de Sevilha, na Espanha.  Na época, a Inquisição estava no auge.  O Vaticano prendia, torturava e matava em nome de Jesus. O Inquisidor tinha poder absoluto na Espanha.  Supostos hereges eram queimados vivos todos os dias em fogueiras públicas, “para maior glória de Deus”, conforme o lema dos implacáveis jesuítas. Como seria, nestas condições, a volta do Cristo?
Segundo a narrativa de Dostoievski, o Mestre decidiu voltar sem anúncio prévio:
“Ele apareceu docemente, sem se fazer notar e – coisa estranha – todos o reconheciam imediatamente. (...)  Atraído por uma força irresistível, o   povo comprime-se à sua passagem e segue-lhe os passos.   Silencioso,  ele passa por entre a multidão com um sorriso de compaixão infinita. Seu coração está abrasado de amor, seus olhos desprendem uma Luz, uma Ciência, e uma Força que irradiam e despertam o amor nos corações. Estende-lhes os braços e  abençoa-os. Uma força curativa emana do seu contato e até mesmo de suas vestes. Um velho, cego desde a infância, exclama no meio da multidão: ‘Senhor, cura-me e eu te verei’.  Uma casca cai dos seus olhos e o cego vê.  O povo derrama lágrimas de alegria e beija o chão sobre as marcas dos seus passos. As crianças lançam flores à sua passagem”. [2]
A população canta e grita ‘Hosanna!’ à passagem do Senhor. Os membros do povo repetem emocionados: “é Ele, é  Ele”.  O Cristo avança pela praça de Sevilha e ressuscita uma garota. No auge da emoção popular, surge na praça da cidade a figura temível do grande Inquisidor. É um ancião quase nonagenário, com uma rigorosa seriedade no rosto e a expressão de quem não admite ser contrariado.  Vestido com uma velha batina preta, rodeado pela sua guarda pessoal, ele percebe num instante o que está ocorrendo. Diante do seu olhar severo a multidão emudece e se inclina até o chão,  respeitosa e  atemorizada.  “Tão grande é o seu poder, e o povo está de tal maneira acostumado a submeter-se, a obedecer-lhe tremendo, que a multidão se afasta imediatamente diante dos guardas”, conta Dostoievski.  Em meio de um silêncio mortal, Cristo é arrastado para a prisão. 
Horas depois, a porta de uma masmorra se abre, rangendo, e o Inquisidor entra na cela do prisioneiro.   Ele olha a Santa Face, como para confirmar a identidade do seu interlocutor, e diz ao Mestre:
“És tu? Não digas nada. Cala-te. Aliás, que poderias dizer? Não tens o direito de acrescentar uma palavra além do que disseste outrora. Por que vieste estorvar-nos? Porque tu nos estorvas, bem o sabes. Mas sabes o que acontecerá amanhã? Ignoro quem tu és e não quero sabê-lo: tu ou apenas tua aparência. Mas amanhã eu te condenarei e serás queimado como o pior dos heréticos, e este mesmo povo que hoje te beijava os pés, amanhã, a um sinal meu, irá alimentar a tua fogueira.”
Enfático, o chefe da Inquisição faz um discurso sacerdotal. Ele alega que o “caminho estreito” ensinado pelo Mestre não pode ser percorrido na prática. Ele é demasiado difícil e só causa mais sofrimento, porque é excessivamente verdadeiro. Afirma que é impossível avançar de fato  pelo caminho da luz e do amor incondicional. Só uma religião autoritária, em que o dogma substitua a sabedoria, pode dar felicidade ao povo. Apenas a mentira organizada e institucionalizada pode garantir a ordem.  A verdade universal não é conveniente.  
Cristo apenas escuta. Ele fita seu carcereiro com olhos serenos, enquanto nos seus lábios há um sorriso de compreensão infinita.  A mente do teólogo-carcereiro não tem segredos para ele. Suas frases já são conhecidas antes que as pronuncie. O guardião da Igreja condena a liberdade individual pregada por Jesus. Os sacerdotes necessitam rebanhos. O Inquisidor considera absurda a idéia de que cada homem seja senhor do seu próprio destino. Ele conclui assegurando ao preso que a sua heresia, e a sua audácia de reaparecer em público, serão punidas com a morte.  
Terminadas as longas alegações, o Mestre não diz uma palavra, mas mantém seu silêncio calmo e cheio de paz.  Depois de alguns instantes, Jesus ergue-se, olha seu acusador nos olhos e o abraça.   O  poderoso Inquisidor fica surpreso, confuso, assustado.  Ele luta para manter o autocontrole psicológico.  A força da santidade do Mestre parece vencê-lo. Ele abre com força a pesada porta da cela. Ele aponta nervosamente para a saída e diz ao Cristo:
“Vai embora. Vai e não volta jamais. Nunca mais!”
O prisioneiro não responde. Com o olhar iluminado e os passos calmos, ele sai da cela, passa pelos guardas e desaparece na noite escura.
Este, resumidamente, é o relato de Dostoievski referente ao século 16. 
O que ocorreria se Cristo aparecesse subitamente no momento atual, cinco séculos depois? Os desafios não seriam poucos.  Quem estaria disposto a largar seus dogmas para viver o ensinamento?  O escritor indiano Anthony de Mello, um jesuíta herege do século 20, inspirado por idéias teosóficas e universalistas e duramente criticado pelo Vaticano, previu esta possibilidade em um pequeno conto simbólico, ambientado em uma situação posterior à volta de Cristo. 
Mello escreveu:
“Foi feita uma proposta, nas Nações Unidas, no sentido de que se corrigissem todos os livros sagrados de todas as religiões. Tudo o que neles tivesse algum sabor de intolerância, crueldade ou fanatismo deveria ser eliminado. O mesmo se faria com toda e qualquer parte que atentasse contra a dignidade e o bem-estar do homem. Imaginem o burburinho quando se veio a saber que a proposta viera do próprio Jesus Cristo! Os repórteres correram à sua residência, ávidos de esclarecimento.  A sua explicação foi simples e curta: ‘As Escrituras, como o Sábado, foram feitas para o homem, e não o homem para as Escrituras!’ , disse ele.” [3] 
O que seria então das grandes instituições humanas se Jesus voltasse, e não fosse morto nem encarcerado?  Qual o poder revolucionário da sua presença física consciente entre os habitantes do século 21?
Ele poderia reaparecer, por exemplo, em meio a um tiroteio, no auge de um conflito inter-religioso qualquer. Quando os atiradores o metralhassem, veriam que seu corpo era imaterial: o Mestre estaria usando apenas um corpo sutil − uma réplica do seu corpo físico − o mayavi-rupa da filosofia esotérica. Ele seria perfeitamente visível, mas não poderia ser tocado ou morto.  
Depois disso, o Mestre surgiria nas ruas de Nova Iorque com seu corpo físico denso. Ele caminharia em direção ao prédio da ONU e seria reconhecido ao atravessar uma rua com sinal vermelho. Os carros parariam. Uma aura de luz branca, transparente, rodearia completamente seu corpo. “Só pode ser Ele”, pensariam as pessoas imediatamente.
O engarrafamento de trânsito se expande enquanto ele avança. Não se ouvem buzinas, porém. Os carros são abandonados com as portas abertas.  Homens e mulheres se ajoelham ao ver o Mestre. Crianças correm para Ele e ele abençoa o povo. De quando em quando, ele interrompe sua caminhada por um momento e cura alguém; e aconselha, consola, ensina.  No portão externo do prédio das Nações Unidas, ele menciona que quer falar com o secretário-geral e são solicitados seus documentos. O Mestre explica que não tem passaporte consigo, mas avisa que “não pretende tomar muito tempo do secretário-geral”. Os guardas têm ordens claras: sem documentos, a entrada não é permitida. O episódio toma vulto. O sistema de segurança é acionado. Em instantes, o Mestre é cercado por Forças Táticas e agentes especiais do F.B.I.  Começa o interrogatório do “suspeito sem passaporte”, e surge o impasse legal.
Quando já está a ponto de ser acusado formalmente de imigração ilegal, o Mestre desaparece no ar. Do episódio fica apenas a perplexidade do público e dos policiais.  Mais uma vez, estava claro que a aproximação visível e consciente entre os Mestres e a nossa civilização não era viável. O Mestre volta ao silêncio dos seus locais de retiro nos Himalaias, de onde são inspirados, entre outros pontos do planeta, os corações de boa vontade.  
A verdade é que, devido às limitações da consciência humana no estágio atual da sua evolução, nenhum grande instrutor pode aparecer no mundo desta forma externa e óbvia, que gera constrangimento e incompreensão.  Os Mestres tampouco “canalizam” mensagens verbais através dos numerosos profetas e intermediários que hoje se pode encontrar a cada esquina.  Toda “volta” personalizada, ocorrendo no plano físico ou verbal, é ilusão.  
O próprio Jesus do Novo Testamento − um personagem, aliás,  simbólico e não histórico −, só foi reconhecido como um mestre e compreendido por alguns poucos indivíduos. E mesmo entre os poucos, ele foi compreendido apenas parcialmente, segundo conta a grande e bela parábola que são os Evangelhos cristãos.  
Os Mestres de Sabedoria, os Imortais, os Arhats, os Rishis, ajudam anônima e incessantemente a humanidade há milênios sem conta. Eles têm colocado à nossa disposição, sob diferentes linguagens e roupagens culturais, uma sabedoria eterna que contém respostas para todos os males humanos. Taoísmo, budismo, hinduísmo, judaísmo, islamismo, cristianismo e diversas filosofias e tradições de distintas épocas contêm lições de suprema beleza e eficácia. Para tirar real proveito delas, basta transcender o dogmatismo e o emocionalismo que tendem a personalizar indevidamente o que é sagrado.  
As diferentes personificações da sabedoria  − entre elas as figuras de Cristo,  Krishna, Buda e Lao-Tzu − funcionam como sinais da existência de seres aperfeiçoados. Tais Mestres não têm vida pública.  Eles preservam corpos físicos, mas vivem anonimamente, afastados da vida social, e trabalham em um plano de consciência que está acima do alcance da imaginação popular.
Ao mesmo tempo, em um nível subjetivo, as imagens públicas dos instrutores sintetizam as nossas melhores aspirações. As imagens conscientes que as pessoas de boa vontade alimentam sobre eles são, em parte, projeções criadas a partir da divindade presente na alma humana. Só não devem ser entendidas literalmente.
Existe em cada ser humano uma  semente divina, e ela deve germinar. Esotericamente, a verdadeira “volta” ou “reaparição” de Cristo é o processo de re-nascimento na alma humana deste nível universal de consciência.  Sobre a volta de Jesus, o Evangelho segundo Mateus afirma:
“Então, se alguém vos disser: ‘Olhe o Messias aqui’ ou ‘ali!’, não creiais. Pois hão de surgir falsos Messias e falsos profetas, que apresentarão grandes sinais e prodígios de modo a enganar, se possível, até mesmo os eleitos. Eis o que eu vô-lo predisse. Se, portanto, vos disserem, ‘Ei-lo no deserto’, não vades até lá; ou ‘Ei-lo em lugares retirados’, não creiais. Pois assim como o relâmpago parte do oriente e brilha até o ocidente, assim será a vinda do Filho do Homem.” (Mt. 24: 23-27)
A luz da sabedoria vem do Oriente, de fato.  Mas, na última frase desta citação, a palavra gregaparusia, traduzida como “vinda”, significa, na realidade, presença. A frase afirma que a presença de Cristo será percebida como um relâmpago de leste a oeste, isto é, em todo o mundo. Helena Blavatsky,  a fundadora do movimento esotérico moderno,   escreveu que o significado desta passagem é duplo.
Em primeiro lugar, a expressão “Vinda de Cristo” significa na verdade “a presença de Cristo em um mundo regenerado e não, de forma alguma, a vinda corporal de Cristo Jesus”. 
Em segundo lugar, “este Cristo não deve ser buscado nem no deserto nem em lugares retirados, nem no santuário de algum templo ou igreja construída pelo homem, porque Cristo – o verdadeiro Salvador esotérico – não é um homem mas o Princípio Divino em cada ser humano.” 
Para Helena Blavatsky, ver Cristo literalmente como um ser humano é um equívoco, mas a imagem pode ser usada no plano simbólico. Ela prossegue:
“Aquele que se esforça por promover a ressurreição do Espírito crucificado em si mesmo pelas suas próprias paixões terrenas, e enterrado profundamente no sepulcro da sua própria carne, aquele que tem força para fazer rolar a pedra da matéria para longe da porta do seu próprio santuário interno, este faz despertar Cristo em si mesmo.” [4]
                                              
Há milhares de anos, nas mais diferentes tradições, o céu simboliza a alma imortal. Na Idade Média, porém, o céu cristão deixou de ser entendido como símbolo e passou a ser encarado de modo literal. O deus monoteísta, criado por teólogos desinformados segundo a imagem e a semelhança deles próprios, é um velho com ar patriarcal e olhar severo que mora entre as nuvens. Ele espia para baixo e tenta  manipular os assuntos humanos, freqüentemente através da violência. 
Do ponto de vista esotérico, por outro lado,  o céu é a imagem simbólica da consciência elevada. A reaparição de Cristo “entre as nuvens do céu” (Mateus, 24:30) significa que o Mestre interior e a sabedoria divina ressurgirão primeiro nos níveis superiores da mente humana, isto é, no plano da inteligência espiritual, da fraternidade universal e do amor incondicional à verdade.
Neste sentido, Cristo não é uma pessoa, mas a luz da Lei do Universo.  A “volta” dele deve ocorrer como um renascimento em cada coração humano. De fato, qualquer grande instrutor da humanidade só poderá aparecer no mundo externo – e ser interiormente reconhecido – quando houver em nós a pureza, a ética e a verdade que formam a essência do sentimento religioso e filosófico. Como diz 2 Coríntios,  6:16:
“Que há de comum entre o templo de Deus e os ídolos? Ora, vocês é que são o templo do Deus vivo”.
A grande oportunidade prática que está diante de nós é, pois, a tarefa da autotransformação. O Natal que comemoramos no Ocidente a cada final de ano simboliza o ressurgimento periódico e sagrado da esperança de redenção individual e coletiva. Ele significa a renovação cíclica do nosso aprendizado, e também a decisão de nascer de novo, a partir da consciência do Mestre interior, isto é, a alma imortal,  que vive em unidade com o universo. Este renascimento se comemora ao mesmo  tempo que o Natal externo. Os presentes físicos e as comemorações visíveis são apenas reflexos externos do verdadeiro resgate anual da consciência da luz, no nível mais essencial de nossas vidas.  Nem todos são conscientes deste processo.
Deste modo, descontadas as aparências e as formalidades, cada Natal traz de certo modo a volta de Cristo, de Buddha e de outros grandes instrutores. Nesta época do ano, um sentimento de paz ilumina invariavelmente a mente humana “como um relâmpago que vem do Oriente” − de um extremo a outro do planeta − e parece compensar por um momento os sofrimentos da alma individual e coletiva.
Não pergunte, pois, quando, ou onde, se dará a volta do Cristo.  A volta do Cristo se dará em sua mente e seu coração, neste exato Natal e neste Ano Novo, e sempre e quando você estiver preparado para ela.
É da consciência de cada cidadão de boa vontade que o grande Advento se irradia, estimulando a regeneração de todas as formas de vida. 
NOTAS:
[1] “Cartas dos Mahatmas Para A.P. Sinnett”, edição em dois volumes, Ed. Teosófica, Brasília, 2001, ver volume I, Carta 21, p. 142.
[2] “Os Irmãos Karamázovi”, de Fiódor Dostoievski, Ed. Nova Cultural, Círculo do Livro. Veja o Capítulo V do Livro V, pp. 203-217.  Em alguns detalhes, segui a tradução feita por Helena Blavatsky diretamente do russo e publicada na revista The Theosophist, Índia, edição de novembro de 1881.
[3] “O Canto do Pássaro”, de Anthony de Mello, S. J. , Edições Loyola, SP, 1995, p. 61.
[4] “Collected Writings of Helena P. Blavatsky”, TPH, Índia, volume 8, pp. 172-173.